Em carta aberta elaborada pelos alunos dos programas de pós-graduação em História Econômica e História Social, da Universidade de São Paulo, eles exclarecem a posição em relação aos atos da Reitora Suely Vilela que, segundo os alunos, desde o início de sua gestão, a presença da Polícia Militar no campus Butantã e o resultado de sua ação no último dia 09/06, não realiza nenhum esforço no sentido de se fazer representar em nossos fóruns de deliberação coletiva.
Texto da carta:
Os alunos dos Programas de Pós-Graduação em História Social e História Econômica da Universidade de São Paulo, em assembléia realizada no dia 23/06, na sala Caio Prado Jr., votaram pelo apoio à declaração de greve deliberada pela Assembléia Geral de pós-graduandos da USP – Capital, realizada no último dia 17/06.
Essa decisão está alicerçada na firme convicção de que os diversos atos de violência ocorridos na USP, sob ordem e tutela da Reitoria e do Governo do Estado, constituem verdadeiros atentados contra todos os princípios que regem a universidade. O conjunto das ações da Reitora Suely Vilela – na verdade um programa de truculência intelectual e política – pretende, por meio de táticas brutais de silenciamento, condenar de antemão toda ação organizada em defesa da melhoria do ensino público superior. Entendemos que, diante desse quadro, a decisão tomada pela Assembléia Geral de pós-graduandos, e que agora ratificamos, pode contribuir nas lutas de toda a comunidade acadêmica para evitar que espaços como a FFLCH, destinados à livre circulação de idéias, sejam transformados em palcos da ignorância.
Desde 2007 a Reitora Suely Vilela dá sinais de seu despreparo para o cargo, quando, por exemplo, se recusou a participar de audiências públicas para debater o posicionamento da USP em relação aos decretos promulgados pelo Governador José Serra contra a autonomia universitária, fazendo, assim, com que os estudantes ocupassem o prédio da reitoria como forma de protesto. No ano seguinte, a Reitora tratou de desrespeitar uma das grandes conquistas daquela greve, o V Congresso da USP, cujo objetivo era debater e formular uma proposta alternativa à reforma do estatuto em curso no Conselho Universitário. Em primeiro lugar, a Reitora inviabilizou a presença dos funcionários da USP no V Congresso, quando decidiu não suspender todas as atividades da universidade, e, em segundo, como resposta às notícias de protestos agendados para aquela semana, demonstrou sua vocação para o autoritarismo, hoje tão clara: convocou um Conselho Universitário extraordinário em área com segurança militar (IPEN), ocasião esta em que foi aprovado o parecer da Comissão de Legislação e Recursos da USP – presidida pelo Prof. João Grandino Rodas –, que autoriza, desde então, a entrada da Polícia Militar no campus, toda vez que, supostamente, a “ordem universitária” for ameaçada. Ainda em 2008, a Reitoria transferiu outra reunião do Conselho Universitário para o IPEN, mas, dessa vez, sem justificativas e sem aviso prévio aos Representantes Discentes e ao Representante dos funcionários. Aproveitando-se da ausência desses representantes, a Reitora inverteu a ordem da pauta e aprovou o orçamento anual da Universidade, sem qualquer discussão aprofundada com a comunidade acadêmica.
Entendemos que estes contínuos atos de desrespeito da Reitora Suely Vilela diante das representações estudantis e de funcionários constituem apenas um reflexo da estrutura de poder da própria USP, isto é, uma estrutura autoritária e, por isso, absolutamente incoerente com o próprio regime democrático reconquistado em nosso país nos anos 1980 – graças à ação organizada da sociedade civil, entre outros espaços, a partir da FFLCH. Essa história de conquistas democráticas torna as decisões da reitoria ainda mais ofensivas, na medida em que se pretende justificá-las mediante um discurso que distorce o próprio conceito de democracia, transformando-o em um princípio predatório (ao invés de laudatório) da res publica.
Lutar por democracia implica comprometimento com o processo democrático e participação efetiva em todas as suas etapas. No que tange aos estudantes, essa luta deve conduzir à reafirmação constante da soberania dos nossos espaços deliberativos, bem como à reação às ações de cunho individualista que, em caso de sucesso, condenariam ao esfacelamento a própria representação discente nas diversas instâncias administrativas da nossa universidade. As assembléias estudantis, a exemplo da que deflagrou a greve entre os estudantes de pós-graduação, são espaços onde a divergência entre opiniões é não apenas respeitada, mas amplamente desejada. É somente graças aos constantes debates de idéias e o respeito às decisões tomadas a partir daí, sejam elas quais forem, que o movimento estudantil na USP pode rejeitar enfaticamente, e de consciência tranqüila, as críticas que sugerem um adesismo às reivindicações das greves simplesmente em função de sua base social. Nenhuma das entidades representativas assumiu postura a priori sobre a greve. Nos fóruns de deliberação, a greve é um instrumento político avaliado em relação às lutas travadas. Por diversas ocasiões, a greve foi rejeitada e, durante os vários anos de história dessas entidades, em nenhum momento uma decisão contrária à greve foi desrespeitada.
É preciso destacar, no entanto, que alguns setores da mídia, e mesmo da comunidade universitária, vêm se utilizando de dados quantitativos sobre o atual movimento grevista obtidos de modo, no mínimo, questionável e não sujeito aos controles dos fóruns coletivos. Os alunos dos programas de pós-graduação em História Social e História Econômica compreendem que o caráter público das entidades representativas da USP não depende do número de presentes nos seus fóruns de representação. A legitimidade de uma instituição pública nasce do respeito ao debate, do acesso livre às instâncias de decisão e ao respeito mútuo entre os participantes. Por isso, defenderemos o DCE, a APG, a ADUSP e o Sintusp como instâncias de discussão e organização imprescindíveis para tornar de fato públicas e democráticas as decisões do Conselho Universitário da USP.
O extremo individualismo em que vivemos dissimula a relação entre o público e o privado. Para nós, o indivíduo que não vai à Assembléia Geral de sua entidade representativa está depreciando a sua chance de agir como um cidadão, de dialogar com a diversidade de opiniões daqueles que têm atividades comuns. Frente à responsabilidade dos cidadãos de se pronunciarem no espaço público, qualquer discussão sobre o direito privado é secundária.
Assim, os alunos dos programas de pós-graduação em História Social e História Econômica, coerentes com o espírito crítico que rege a nossa Faculdade, repudiam a presença da Polícia Militar na Universidade e a política predatória da Reitora Suely Vilela e reivindicam a democratização da USP, transparência nas reuniões do Conselho Universitário e a revogação imediata da resolução que permite a entrada da PM no campus. Ao mesmo tempo, afirmamos a necessidade de discussão específica para assuntos da pós-graduação, com participação direta e efetiva dos nossos representantes na tomada de decisões sobre temas como orçamento, políticas de permanência e oferta de disciplinas. Para isso, é necessário que as nossas posições sejam constantemente reforçadas pela consolidação dos espaços de deliberação, em defesa de uma universidade verdadeiramente pública, democrática e de qualidade.
Link para obter a carta: http://poshistoriausp.wordpress.com/.