Técnica cirúrgica para mudar a cor dos olhos é experimental e perigosa à saúde ocular
Tentativas de mudar a coloração genética dos olhos sempre existiram… De italianas de olhos claros que os tornavam escuros, instilando nos olhos extrato de Beladona (atropina)… Há também truques e possibilidades computadorizadas oferecidas pelo Photoshop… Isto, sem falar nas lentes cosméticas, que tornaram-se uma febre mundial…
As primeiras lentes que alteravam a cor da íris surgiram em meados da década de 80. Eram de coloração levemente azulada, com o objetivo de facilitar a colocação e a remoção do artefato. “Alguns anos mais tarde, apareceram as lentes cosméticas propriamente ditas, fabricadas com a intenção de mudar a coloração da íris. Algumas eram translúcidas e o efeito no visual dependia da interação da cor da lente com a cor da íris. Outras eram opacas e permitiam que usuários com íris escuras pudessem aparentar ter olhos claros”, explica a oftalmologista do IMO, Instituto de Moléstias Oculares, Sandra Alice Falvo.
Feitas de material hidrofílico, estas lentes gelatinosas foram responsáveis por criar visuais irreverentes, como imitações dos olhos dos felinos e de criaturas demoníacas… Mais apropriados para o teatro do que para a vida real. “Mas é bom lembrar também que estas mesmas lentes cosméticas podem ser usadas por pessoas que sofreram traumas ou tiveram doenças que provocaram a formação de cicatrizes e deformações na córnea. Nestes casos, as lentes de contato coloridas com pupila negra recuperam a estética ocular destes pacientes, colaborando com a melhora da auto-estima dessas pessoas”, diz a oftalmologista.
Um ritual de moda
“Há alguns anos, o uso das lentes coloridas passou a fazer parte de certos rituais de moda. Este emprego estético, ligado à displicência juvenil, ajudou a difundir a idéia equivocada de que sua adaptação não demandava cuidados, tal qual ‘uma lente de contato de verdade’ ”, observa Sandra Alice Falvo.
A comercialização inadequada das lentes cosméticas (inclusive pela Internet), sem as devidas orientações sobre limpeza, conservação e tempo de uso do produto e a disseminação das lentes cosméticas como os principais fatores que geram as queixas em relação ao uso das lentes de contato. Nos Estados Unidos, o Food and Drug Administration(FDA) chegou a emitir um comunicado, alertando os consumidores sobre os riscos do uso das lentes de contato cosméticas sem acompanhamento especializado. No mesmo documento, solicitou às autoridades estaduais que colocassem empecilhos à sua comercialização e às autoridades alfandegárias que controlassem de alguma forma a importação deste produto.
No Brasil, o número de usuários – constantes ou esporádicos – dessas lentes com o propósito único de mudar a cor dos olhos vem aumentando. Consultórios e clínicas registram um aumento de casos de problemas de saúde ocular ligados ao uso indevido destas lentes. “Na adaptação das lentes cosméticas também é obrigatório o exame oftalmológico. O sucesso na adaptação e no uso de lentes de contato depende de um conjunto de fatores. A prescrição médica e o acompanhamento do oftalmologista constituem-se nos elementos primordiais deste processo. Em seguida, destaca-se a adesão do paciente ao tratamento”, defende a oftalmologista.
Durante o processo de adaptação às lentes de contato, o oftalmologista deve ser minucioso nas instruções fornecidas ao paciente sobre limpeza, conservação e troca das lentes. O oftalmologista, além de fornecer as orientações necessárias, deve certificar-se da perfeita compreensão do paciente e, em cada consulta, verificar seu conhecimento e conduta, assegurando a adesão às recomendações e a prevenção de complicações. “As lentes de contato só não são indicadas para quem tem algum tipo de alergia, infecção ou doença ocular, baixa produção lacrimal ou intolerância ao produto”, diz Sandra Falvo.
Uma cirurgia para mudar a cor dos olhos
E como se já não bastassem os problemas causados pelo uso indevido das lentes cosméticas, nos deparamos, agora, com outra ameaça à saúde ocular. “Estamos sendo questionados pelos pacientes a respeito de uma cirurgia, realizada no Panamá, que implanta uma lente colorida na frente da íris, tampando a cor original dos olhos. Não recomendamos que ninguém se submeta a um procedimento experimental, muito menos por uma razão estética. Esta tal cirurgia para mudar a cor dos olhos pode acarretar em complicações sérias e irreversíveis, tais como a cegueira. As chances de ter glaucoma, inflamações no olho e descompensação da córnea são enormes”, afirma o oftalmologista Virgilio Centurion, diretor do IMO.
No Panamá não é exigido que se façam pesquisas experimentais e testes em humanos antes que o procedimento seja oferecido comercialmente à população. “Outro absurdo é comparar o procedimento à cirurgia de catarata, onde a lente implantada substitui o cristalino. Este é um procedimento seguro, baseado em evidências, testado e realizado por oftalmologistas em todo o mundo. É ensinada nas faculdades, é conhecida de todo o mundo acadêmico, não é atributo de um ou de outro profissional buscando ibope”, diz Centurion.