O Brasil registrou de janeiro a junho de 2009 um novo aumento dos investimentos diretos estrangeiros (IDE) do Japão. O volume atingiu US$ 565,2 milhões, representando crescimento de 158% em relação ao mesmo período de 2008, em que houve entrada de US$ 356,6 milhões. Ainda que seja difícil imaginar o mesmo volume de recursos totais de 2008, que foi de US$ 4,1 bilhões, os dados do primeiro semestre mostram que persiste o interesse nipônico sobre a economia brasileira. Rei Oiwa, diretor de pesquisas da Jetro no Brasil, apresenta dados que corroboram essa percepção: em 2008, o escritório brasileiro foi o sexto mais consultado dentre 73 representações da Jetro em 55 países e a procura em 2009 tem mantido os mesmos níveis elevados.
Dados do Banco Central do Brasil demonstram que a tendência de aumento dos fluxos de IDE japoneses ao país está presente desde o inicio da estabilização da economia brasileira, em meados dos anos 1990. No ano de 2008, o destaque foi o grande volume de IDE destinado ao setor de extração mineral, que totalizou cerca de US$ 3,3 bilhões. Excluindo esse valor o total de IDE japonês em 2008 atingiria US$ 764,1 milhões, ficando próximo à média de US$ 695,7 dos anos de 2001-2007, período que marca a retomada do crescimento da economia e do IDE do Japão. Em 2008, apesar da crise internacional, que afetou fortemente também o Japão, o IDE desse país não só continuou fluindo ao Brasil como aumentou.
Pode-se observar, ainda nesse período 2001-2008, que o Brasil tem permanecido entre os 15 maiores destinos no mundo ao IDE do Japão, com exceção de 2004, quando houve um pequeno desinvestimento, de acordo com os dados estatísticos da Jetro (Japan External Trade Organization). Portanto, pode-se perceber que o interesse do empresariado japonês pelo Brasil não é só retórico, pelo fato do país ser um membro do grupo denominado BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China). Percebe-se que o interesse está se concretizando em novos investimentos, conduzindo a uma elevação de 356% no estoque de IDE do Japão no período de 2001 a 2008, passando de US$ 4,6 bilhões para US$ 16,5 bilhões. Em 2008 o Brasil registrou o segundo maior estoque de IDE japonês entre os BRIC, ficando atrás da China (US$ 49 bilhões), em terceiro ficou a Índia (US$ 9,4 bilhões) e a Rússia (669 milhões) em quarto.
Ao longo do recente período de crescimento econômico do Japão (2001-2007), os cinco segmentos da economia brasileira se destacaram por receberem maiores fluxos de IDE foram: a) extração de minério de ferro (US$ 4,2 bilhões); b) fabricação de equipamentos transmissores de rádio e televisão (US$ 706,8 milhões); c) fabricante de automóveis, camionetas e utilitários (US$ 706,8 milhões); d) seguro de vida (US$ 408,5 milhões); e) produção de laminados planos de aço (US$ 371,2 milhões).
Dentre esses setores pelo menos duas operações chamam atenção pelas suas dimensões. O primeiro grande negócio é o na extração de minério, que foi a venda por US$ 3,08 bilhões em 2008, de 40% de participação na mineradora Nacional Minérios S.A (Namisa) pela Companhia Siderúrgica Nacional ao consórcio formado pelas siderúrgicas japonesas Nippon Steel, JFE Steel, Sumitomo Metal Industries, Kobe Steel e Nisshin Steel, pelatrading Itochu e pela produtora sul-coreana de aço Posco. O segundo destaque foi a negociação de seguros envolvendo a Tokyo Marine, que em 2005 formou uma joint-venture com o Banco Real, investindo R$ 897 milhões. No entanto, com a aquisição do Banco Real pelo Santander em 2007, havia a de se negociar também os 50% da participação japonesa da Real TokioMarine Vida e Previdência, o que ocorreu em fevereiro deste ano, pelo valor de R$ 678 milhões.
O segmento de equipamentos transmissores de rádio e televisão foi o segundo setor que mais recebeu investimentos japoneses no período em análise, os registros do Banco Central apontam que as inversões ocorreram em 2001 (US$ 340,0 milhões), 2002 (US$ 110,2 milhões), 2003 (US$ 241,9 milhões) e 2005 (US$ 14,65 milhões). O curioso é que eles ocorreram antes da decisão final do governo brasileiro pela adoção do sistema digital japonês que ocorreu em 2006, depois desse ano não há novos investimentos anotados. Há expectativas de ampliação de mercado, caso haja adoção do sistema japonês também pelos países vizinhos do Brasil na América do Sul, o que poderia potencializar a vinda de novos recursos. Até o momento, somente o Peru, em abril de 2009, decidiu adotar o padrão japonês e a Argentina sinaliza que poderá acompanhar a decisão.
No setor automotivo registra-se o crescimento da produção das montadoras japonesas no Brasil. O aumento da produção entre 2001 a 2008 foi de 595% pela a Honda elevando de 22.058 para 131.139 unidades totais, de 455% pela Toyota aumentando de 14.649 unidades para 66.693, de 434% pela Mitsubishi variando de 8.571 para 37.203 unidades totais e de 142% pelaNissan passando de 3.744 (2002) para 5.316 unidades totais. Esta última iniciou a produção de veículos em 2009, o que deverá conduzir a uma aceleração no crescimento da sua produção brasileira.
Já no segmento de aços planos o destaque foi o aumento da participação da Nippon Steel na Usiminas em 2006 pela aquisição de 50,9% de participação na Nippon Usiminas. Após essa operação a empresa japonesa se comprometeu em fornecer à Usiminas a mais recente tecnologia para a produção de lâminas de aço destinadas aos fabricantes automotivos japoneses no Brasil. Em 2009, nos dados até abril, o Banco Central já registrou mais US$ 132 milhões em IDE do Japão para produção de laminados de aço, confirmando as notícias de que as empresas desse país no setor siderúrgico, como a JFE Steel, Nippon Steel Sumitomo MetalsIndustries têm sinalizado interesse em novas inversões no país.
Além desses segmentos mais tradicionais, o setor de biocombustíveistambém vem se destacando, totalizando cerca de US$ 254 milhões nos últimos três anos, sendo US$ 54,3 milhões em 2007, US$ 145,5 milhões em 2008 e neste ano já se somam US$ 54,2 milhões. Esses investimentos são importantes por criar parcerias com empresas japonesas, servindo como artifício para contornar parte de um problema, que é dar ao mercado do Japão segurança de fornecimento no longo prazo. Um exemplo é a ação conjunta entre a Petrobras e a Mitsui, anunciada em 2007, para construção de 40 usinas para produção de álcool no país. Mais recentemente, a notícia promissora é o fechamento do contrato de longo prazo entre a Cosan e a Mitsubishi, em julho deste ano, para exportação de etanol ao Japão. Por enquanto, os resultados são tímidos, em 2007 registraram-se exportações de aproximadamente 300 milhões de litros de etanol ao mercado japonês, o maior volume até o momento. Os cerca de 80 milhões de litros que deverão ser exportados pela Cosan, representa cerca de 2% apenas do total de cerca de 3,5 bilhões de litros estimados para exportar ao mercado japonês. Mas, há expectativas otimistas de incremento nesse volume pela preocupação do governo japonês em cumprir a meta de redução das emissões de gases de efeito estufa. O aumento das exportações potencializará a vinda de novos fluxos de IDE do Japão ao Brasil.
As condições atuais, apesar das dificuldades enfrentadas pelo Japão com a sua economia, o Brasil registrou no primeiro semestre de 2009 um total de IDE japonês de US$ 565,2 milhões, uma variação de 158% frente os US$ 356,6 milhões no mesmo período de 2008. Todos esses dados permitem a formulação de expectativas otimistas, não só pela manutenção do fluxo IDE japonês, como também por uma tendência de crescimento.
*Alexandre Ratsuo Uehara é Doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo, Professor de Relações Internacionais nas Faculdades Integradas Rio Branco, Membro do Grupo de Conjuntura Internacional da USP – Coordenador da área Japão