A pandemia de 1918, conhecida como gripe espanhola, é considerada uma das mais devastadoras da história, tendo matado mais de 20 milhões de pessoas no mundo. De acordo com um novo estudo, seu impacto foi tão grande que continua quase um século depois.
Segundo pesquisa feita por cientistas ligados ao Instituto Nacional de Alergias e Doenças Infecciosas (Niaid, na sigla em inglês), um dos Institutos Nacionais de Saúde do governo dos Estados Unidos, a gripe de 1918 deu origem a uma dinastia viral que persiste nos dias atuais.
De acordo com Anthony Fauci, diretor do Niaid, e colegas, em artigo publicado nesta segunda-feira (29/6) na edição on-line do New England Journal of Medicine, o mundo tem vivido em uma era de influenza pandêmica desde então.
Segundo eles, o vírus H1N1, causador da gripe A, embora novo, é outra manifestação da mesma família viral que matou milhões no início do século 20.
“A pandemia de influenza de 1918-1919 foi um evento marcante na história da saúde pública e seu legado continua de muitas formas. Os descendentes do vírus de 1918 têm circulado pelo mundo desde então”, disse Fauci.
Os vírus da influenza têm oito genes, dos quais dois codificam para proteínas virais de superfíce (hemaglutina e neuraminidase), que permitem ao vírus entrar na célula hospedeira e se espalhar por outras. Há 16 subtipos de hemaglutina e nove de neuraminidase, que resultam em 144 combinações possíveis das proteínas.
Do total de combinações, até hoje se identificou que apenas três (H1N1, H2N2 and H3N2) estão totalmente capacitadas a infectar humanos. Outras combinações, como o H5N1, causador da gripe aviária, podem ocasionalmente atingir humanos.
“Os oito genes da influenza são como um time. Algumas combinações de jogadores podem ser formadas e dotar o vírus de novas capacidades, como a de infectar um novo tipo de hospedeiro”, disse David Morens, outro autor do estudo.
Segundo os pesquisadores, foi isso que deu início à pandemia em 1918. O vírus original era do tipo que afetava apenas aves, mas, por meio de mecanismos ainda desconhecidos, adquiriu a capacidade de infectar pessoas e de se espalhar rapidamente entre elas.
O estudo destaca que, durante a pandemia, o H1N1 de 1918 foi transmitido de humanos a porcos, nos quais – da mesma forma que em pessoas – continuou a evoluir.
“Todos os vírus da influenza A atuais e adaptados aos humanos – sejam variações sazonais ou aqueles que causam pandemias mais dramáticas – são descendentes, diretos ou indiretos, daquele vírus fundador. Ou seja, podemos dizer que estamos vivendo em uma era de pandemia que começou em 1918”, disse Jeffery Taubenberger, outro pesquisador do Niaid e autor do estudo.
Mas, apesar de a dinastia fundada em 1918 não dar sinais de que será extinta, os autores observam que há motivos para otimismo. Quando analisadas por um intervalo de tempo de décadas, as pandemias e epidemias causadas pelos descendentes do vírus original parecem estar menos severas.
Os pesquisadores destacam que há muito ainda a entender sobre o assunto, como, por exemplo, as maneiras por meio das quais um novo gene da influenza salta de aves para um novo tipo de hospedeiro, seja o homem ou outros mamíferos.
O artigo The persistent legacy of the 1918 influenza virus, de Anthony Fauci e outros, pode ser lido por assinantes do New England Journal of Medicine em http://content.nejm.org.
Agência FAPESP