Típicas da temporada de chuva, as cheias voltaram a assolar a Amazônia, causando danos à população em várias cidades da região. Além de perder todos os bens, essas pessoas ainda correm o risco de contrair doenças transmitidas por água contaminada, como a hepatite A . Ao contrário da leptospirose, essa infecção no fígado pode ser prevenida por vacina, como apontam especialistas.
Desde outubro, o Ministério da Saúde realiza nas capitais da Região Norte o Inquérito Nacional das Hepatites Virais, que vai pesquisar a prevalência da hepatite A em crianças e jovens entre 5 a 19 anos e dos tipos B e C em pessoas entre 10 a 69 anos. Só em Belém, serão pesquisadas 1.020 pessoas.
De transmissão fecal-oral, a hepatite A é contraída por ocasião da ingestão de líquidos ou alimentos contaminados pelas fezes de uma pessoa doente. Na época das cheias, os rios transbordam e levam toda a sorte de impurezas para as casas, estabelecimentos comerciais e carros, entre elas fezes de pessoas contaminadas com o vírus da hepatite.
Em áreas de alta endemicidade, como nas regiões ribeirinhas, boa parte das pessoas tem contato com o vírus da hepatite A na infância, fase da vida na qual esta infecção do fígado nem sempre se manifesta clinicamente. A partir dos seis anos, 70% dos infectados pelo vírus apresentam os sintomas como febre, sensação de fraqueza, náuseas, vômitos, falta de apetite, seguidos de icterícia (coloração amarelada dos olhos, das mucosas e da pele), urina escura e fezes esbranquiçadas.
Na opinião do infectologista e imunoalergologista Newton Bellesi, do Belém do Pará, o levantamento do Ministério da Saúde é oportuno, porque a região Amazônica vive hoje duas realidades diferentes. “Nos locais com saneamento básico precário, onde existem muitas fossas, as pessoas entram em contato com o vírus na infância e não desenvolvem a doença. Já nas cidades servidas por rede de esgoto, a transmissão ocorre após a infância, o que coloca em risco a saúde da população”, afirma este médico, um dos fundadores da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm) e da regional paraense da Associação Brasileira de Alergia e Imunopatologia.
Na opinião de Bellesi, muitas cidades estão melhorando o sistema de saneamento básico, o que contribuirá para o surgimento de uma geração que ficará vulnerável à hepatite A, passada a infância. “Por isso, o melhor meio de prevenção é a vacina ainda na infância. Além de a criança ser a maior transmissora do vírus da hepatite A, a doença em adultos se manifesta de forma mais grave”, ressalta.
Mesmo passada a enchente, o perigo continua, porque o vírus é muito resistente e capaz de sobreviver 30 dias em alimentos secos (pães, bolachas, etc), 10 meses em frutas congeladas a 30° C negativos e 89 dias em água mineral conservada a 20° C.
Embora não deixe sequelas na maioria dos casos, a hepatite A não é uma doença absolutamente benigna. Com alguma frequência demanda internações por conta de complicações como mal-estar e desidratação e, às vezes, pela possibilidade de a doença evoluir para uma forma aguda grave, a hepatite fulminante. Essa forma de hepatite pode levar a óbito cerca de 0,1% das crianças e jovens que apresentam icterícia e até 2% dos adultos ictéricos acima de 40 anos. Nesses casos, indica-se transplante do fígado, com todos os seus riscos.
No Brasil, a vacina é recomendada tanto pela Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) como pela Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), mas não integra o calendário de vacinação do Ministério da Saúde. A vacina está disponível nas clínicas particulares para maiores de um ano e nos Centros de Referência de Imunobiológicos Especiais (CRIEs), órgãos da rede pública de saúde, apenas para grupos específicos de indivíduos.
A Sanofi Pasteur, a divisão de vacinas do grupo Sanofi-Aventis, disponibiliza as vacinas internacionalmente conhecidas por Avaxim 80U (para crianças e adolescentes entre um e 15 anos) e a Avaxim 160 U para os maiores de 15 anos. A vacina de uso pediátrico pode ser aplicada a partir de 12 meses, com reforço entre seis a 18 meses depois. Para a população maior de 15 anos, a vacina deve ser administrada com uma dose inicial e outra de reforço.