Está enganado quem vê nas atuais pressões sobre o Legislativo a intenção oculta de fechar o Congresso Nacional. É o contrário. O que se quer é abri-lo. Ou reabri-lo. Não apenas abrir as contas das passagens aéreas, da gasolina, da alimentação, das verbas de gabinete e das assemelhadas. Mas reabrir de fato a Câmara dos Deputados e o Senado Federal, para que a agenda das benesses ocultas seja superada e o poder volte a suas atividades normais.
O que não se admite, entretanto, é chantagem. Algo assim como “se eu não puder usar a minha cota de passagens aéreas para viajar com minha mulher a Londres e Paris a democracia estará seriamente ameaçada; afinal, não se pode falar em democracia sem um parlamento atuante”. Parlamento atuante não é parlamento itinerante. O leitor já percebeu que os alhos nada têm a ver com os bugalhos. Já percebeu que o político poder usar o dinheiro do povo para passear com a família de avião não é requisito indispensável para que um regime seja caracterizado como democrático.
Vamos falar a sério. Para que o Congresso saia da crise, é preciso em primeiro lugar que os congressistas resistam à tentação de posar como vítimas. Até porque não pega bem. É preciso tratar o assunto com racionalidade. Você conhece por acaso algum emprego em que o sujeito, tendo que viajar regularmente, receba da empresa verba extra para levar junto a mulher e os filhos nas viagens profissionais?
O cidadão que mora fora de Brasília e se elege deputado ou senador tem duas opções. Ou continua residindo no estado e vem à capital só para trabalhar, ou se muda para Brasília e viaja ao estado apenas a serviço. Considerando que na prática só há sessões deliberativas da Câmara e do Senado às terças e quartas-feiras, a rotina de quem decida continuar morando no estado implicará duas noites por semana fora de casa. Ora, se o cidadão não acha razoável dormir fora de casa duas vezes por semana, que não seja senador, nem deputado. Que escolha outra atividade.
E sempre há a opção de se mudar com a família para Brasília. O que também resultará em algum sacrifício. Quando tiver que ir às bases eleitorais, não poderá levar a mulher ou os filhos junto. Mas isso não chega a ser problema. Qual é o deputado ou senador que carrega regularmente a família nos périplos dos fins de semana pelos municípios? Eu não conheço nenhum. Se você conhece, peço por favor que me apresente.
A proposta já aprovada no Senado e que deve ser referendada no plenário da Câmara dos Deputados é razoável. O sujeito tem uma verba para viagens políticas. É dinheiro para ser usado em serviço pelo parlamentar e por assesssores devidamente indicados. Se não for gasto dentro do período, deixa de estar disponível. Espera-se que os deputados tenham o bom senso de aprovar a regra, para que se vire essa página e se adote uma espécie de “jurisprudência” para os demais casos de “salário indireto” que vêm por aí.
Fonte: Blog do Alon