A puberdade vem se antecipando na vida das crianças, não há dúvida, nem discordância entre os estudiosos. Talvez, por isso mesmo, é que o impacto do atraso puberal cause enorme desajuste, com comprometimento da sociabilidade e do rendimento escolar.
“Muitas vezes, percebemos na prática clínica, que os pais antecipam esta preocupação infantil e influenciam negativamente no sentimento de desconforto dos seus filhos, que se sentem diferentes e inferiores em relação aos colegas e amigos de mesma idade. Há também a comparação entre pais com relação às várias etapas de vida de seus filhos: quando andaram, falaram pela primeira vez, leram as primeiras letras. Nesse contexto, aparecem os detalhes da puberdade, muitas vezes, em idades diferentes, mas nem por isso, inapropriados ou atrasados”, afirma a endocrinologista Ellen Simone Paiva, diretora do Citen, Centro Integrado de Terapia Nutricional.
Quando a puberdade vem…
A puberdade é desencadeada a partir de impulsos hormonais e cerebrais que alcançam os ovários nas meninas e os testículos nos meninos, desencadeando a produção dos hormônios sexuais – a testosterona deles e o estrogênio delas. “Esses hormônios são responsáveis pelo estirão puberal de crescimento, um rápido aumento da estatura que ocorre por volta dos 10-11 anos nas meninas e dos 12-13 anos nos meninos, coincidindo com o aparecimento dos caracteres sexuais secundários em ambos. Após essa fase rápida de crescimento, meninos e meninas desaceleram o crescimento e atingem sua altura final, elas, por volta dos 14-15 anos e, eles, por volta dos 18 anos”, explica a endocrinologista.
Assim, o atraso puberal, na maioria das vezes, é antecipado por uma velocidade de crescimento aquém do esperado e pela baixa estatura da criança, em relação aos seus pares, prenunciando que alguma coisa não vai bem no desenvolvimento infantil. “Coincidindo com o déficit de crescimento, a falta do estímulo dos hormônios sexuais impede que ocorram as mudanças corporais características dessa fase, o aparecimento do broto mamário nas meninas e o aumento do volume testicular nos meninos”, diz Ellen Paiva.
… e quando ela não vem…
A idade considerada limítrofe para o início dos sinais de puberdade é variável, principalmente em termos raciais, mas meninos e meninas devem ser investigados sempre que seu desenvolvimento se diferencia de seus pares. “Em média, as mudanças começam a ocorrer aos 10 anos nas meninas e aos 12 anos nos meninos. O diagnóstico da causa do atraso puberal pode demandar uma observação prolongada dos pacientes até que as verdadeiras deficiências hormonais se definam”, alerta Ellen Paiva.
As causas do atraso puberal são variadas e vão desde alterações do sistema nervoso central, de onde partem os estímulos que desencadeiam a produção de hormônios sexuais pelo testículo e pelo ovário, até à falência de resposta desses órgãos-alvo, que podem não responder ao estímulo central normal. Para a causa mais comum de atraso puberal, que chamamos de atraso constitucional do crescimento e puberdade, não encontramos motivos que possam explicar a falha no desencadeamento do fenômeno da puberdade e o tratamento pode propiciar o ‘start’ necessário para que o organismo retome sua engrenagem hormonal. “Para todas as causas de atraso da puberdade, o diagnóstico poderá ser feito mais precocemente e com maiores chances de sucesso no tratamento, se pudermos iniciar esta investigação também mais cedo”, diz a médica.
Tratando o problema
Mesmo diante de alterações hormonais graves e definitivas é possível induzir o fenômeno puberal nas idades adequadas para cada criança, levando em conta seu sexo e sua estatura. “Nas crianças muito baixinhas, há a necessidade de adequação da altura com tratamento focado nessa alteração. Ao iniciar a puberdade, essas crianças podem também acelerar a maturação óssea, apressar a fusão dos núcleos ósseos de crescimento localizados nas extremidades dos ossos longos e inviabilizar o alcance de uma altura final adequada. Por isso, o tratamento do atraso puberal deve sempre ser compartilhado com o tratamento da baixa estatura, uma vez que as duas andam juntas”, defende a diretora do Citen.
Com o tratamento do atraso puberal, parte das crianças assume o controle de seu eixo hormonal e alcança a maturação sexual completa com ovulação e menstruação nas meninas e espermatogênese nos meninos. “Outros requerem a manutenção dos níveis hormonais através da administração contínua de hormônios, que simulam a ciclicidade hormonal nas meninas e a produção testicular de testosterona nos meninos. A capacidade reprodutiva destes adolescentes também é variável, com casos de completa normalidade e outros quadros de infertilidade”, conta Ellen Paiva.
Mesmo com o tratamento, muitas crianças não alcançam seus alvos estaturais e permanecem aquém da média de altura familiar. “Temos avançado muito nesse quesito. O nosso arsenal terapêutico tem ganhado o reforço do melhor conhecimento dos efeitos do hormônio de crescimento nessas crianças, mesmo que elas não apresentem tal deficiência. Novos medicamentos têm sido estudados e viabilizados, no sentido de permitirem, principalmente nos meninos, o desencadear da puberdade sem o fechamento dos núcleos de crescimento, o que os impediria de continuar crescendo. Esses medicamentos estão em fase adiantada de pesquisa e com resultados muito promissores na possibilidade de melhorarem a altura final desses pacientes”, explica a endocrinologista Ellen Paiva.
A importância do tratamento precoce dessas crianças reside no fato de que elas, muitas vezes, se sentem incapazes de competir com seus pares, tanto intelectualmente, quanto nos esportes, e tendem a tornarem-se imaturas e retraídas. “O atraso puberal, por ocorrer em uma fase crítica de formação da personalidade, pode resultar em baixa auto-estima e desajuste social. Com a intervenção precoce, isso pode ser adequadamente diagnosticado e corrigido”, defende a médica.