O deputado federal Ernandes Amorim (PTB-RO) é acusado pelo desmatamento irregular de 1,6 mil hectares da floresta amazônica em fazendas que seriam de sua propriedade no município de Machadinho D`Oeste (RO). O local fica a cerca de 350 km da capital Porto Velho. As derrubadas teriam ocorrido inclusive em áreas de Unidades de Conservação (UCs). A investigações iniciais foram realizadas pela Polícia Federal (PF).
A denúncia chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF) em março deste ano. A pedido do procurador-geral da República Antonio Fernando de Souza, o ministro do STF Carlos Alberto Menezes Direito decidiu abrir um inquérito sobre o caso. Agora o processo aguarda parecer na Procuradoria Geral da República (PGR), onde está desde 14 de abril. Na sequência, a matéria deve seguir para julgamento no STF, a mais alta instância do Judiciário.
Segundo nota divulgada pelo STF, o laudo do Ministério Público (MP) de Rondônia apurou que os danos causados à floresta seriam de responsabilidade do parlamentar, apontado como proprietário das fazendas “Carnaval 70” e “Monte Aurélio”, vizinhas à Unidade de Conservação. Segundo o MP, uma das áreas, localizada na margem direita do Rio Machado, foi transformada em pastagem de gado, impedindo a regeneração da mata derrubada. A PGR vê “fundados indícios dos delitos ambientais”.
À Repórter Brasil, Ernandes Amorim afirmou possuir apenas uma posse na região: a da Fazenda Monte Orebe, que tem 800 hectares. Segundo o deputado, a posse teria “mais de 70 anos” e é utilizada como “área de lazer” – ele promove pescarias ao lado de amigos no local. O pecuarista explica ainda que a fazenda possui 300 hectares de pasto, além de pomar, escola, posto de saúde e igreja. “É um título definitivo antigo, que não conheço nem o dono”, diz. Ele afirma ter pago R$ 100 mil pela propriedade.
Para o deputado, as acusações sobre o suposto crime ambiental são “denúncias velhas” que estariam sendo reabilitadas em decorência de uma perseguição política. “Não andei desmatando terra da União nem de reserva”, alega. “O comando maior do Ibama quer me criar problema. Sou assíduo combatente das atitudes do órgão. Não vou recuar”. Em permanente conflito com a fiscalização ambiental, Amorim já ameaçou até expulsar o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) de Rondônia.
O parlamentar apresentou a sua primeira defesa e aguarda ser intimado. Ele reconhece, porém, que faz “oposição ao sistema e a lei ambiental na forma que querem implantar na Amazônia Legal”. Talvez por isso já reúna o total de R$ 6 milhões em multas do Ibama. “Esse valor é impagável”, reclama.
Histórico
Ernandes Amorim chegou a ser preso com outras 20 pessoas durante a Operação Mamoré, desencadeada pela PF em agosto de 2004. Ele foi acusado de comandar um esquema de corrupção que desviou R$ 18 milhões da Prefeitura de Ariquemes (RO), uma das principais cidades do Estado. Na época, passou quase três meses na cadeia. Amorim esteve à frente do executivo municipal em duas oportunidades (1988-1992 e 2000-2004).
O deputado, que em 2004 foi solto por determinação do Superior Tribunal de Justiça (STJ), também nega essas acusações e diz que foi vítima de uma “armação” dos promotores de Justiça. “A prefeitura nunca teve isso (R$ 18 milhões) em caixa”, afirma. “Disseram até que eu estava garimpando diamantes numa reserva indígena”. A sua filha Daniela Amorim (PTB), que também já esteve à frente da prefeitura local, ocupa atualmente uma cadeira na Assembléia Legislativa de Rondônia.
O histórico político de Amorim também é conturbado. Ele já exerceu o cargo de senador entre 1994 e 2000. Em 2001, porém, foi cassado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) por abuso do poder econômico nas eleições de 1994. Também foi eleito deputado estadual por duas vezes (1986-1988 e 1992-1994). No seu currículo, constam muitas trocas de partido. Ele já integrou o PDT, PMDB, PFL (atual DEM), PPB (atual PP), PRTB e, por fim, PTB.
Congresso
A atuação parlamentar do ex-senador é direcionada aos mesmos temas polêmicos que causaram conflitos com o Judiciário e o governo federal. Um dos exemplos é a sua visão sobre a Medida Provisória (MP) 458/09, um dos principais projetos do governo para promover a regularização fundiária na Amazônia. A medida autoriza a transferência sem licitação a particulares de terrenos da União de até 1,5 mil hectares.
O deputado já propôs quatro emendas à medida. Num discurso proferido no Congresso Nacional neste mês, Amorim defendeu que a MP 458 “teria que doar essas terras às pessoas que querem trabalhar, que querem produzir”. Diversos especialistas, movimentos sociais e parlamentares da própria base do governo temem que a iniciativa possa nivelar posseiros e “grileiros” em áreas marcadas por conflitos e desmatamento.
Outro ponto de atrito se deu com os povos indígenas. O petebista já defendeu que a Fundação Nacional do Índio (Funai) não deveria ser a única “tutora” sobre o tema. E foi contra, por exemplo, à decisão do STF pela demarcação em área contínua da Reserva Indígena Raposa Serra do Sol. Ele apóia ainda a regularização de áreas de garimpo localizadas em terras indígenas. Em dezembro do ano passado, chegou a sugerir ao governo a retirada da adesão do Brasil à “Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas”, que estabelece normas em prol de comunidades tradicionais.
Na Câmara dos Deputados, entre outras funções, Ernandes Amorim é titular da Comissão de Minas e Energia e suplente da Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural, e da Subcomissão Especial para Tratar das Questões Ambientais e seus Impactos no Agronegócio no Brasil.
Idéias absurdas
Apesar de responder ao processo no STF, Ernandes Amorim diz que vai continuar combatendo as “idéias absurdas” propostas para a Amazônia Legal, que viriam de organizações não-governamentais (ONGs) motivadas por “interesses internacionais”. “Quando falam em Amazônia, enchem uma sala com meia dúzia de barbudinhos e ganham dinheiro em cima de quem não conhece a floresta, em detrimento das pessoas que moram aqui”, diz.
Ele explica, por exemplo, que vai propor um projeto de lei para diminuir em 30% toda área de reserva que exceder mais de 20 mil hectares na Amazônia. “É um absurdo a quantidade de reservas criadas sem nenhum critério”, explica. “O meio ambiente é para cuidar do bem-estar da população. Não é para prender. A questão não vai ser resolvida na base do armamento”.
Por Maurício Reimberg – reporterbrasil