Em 1796 o médico inglês Edward Jenner deu início a uma revolução: tornou possível a prevenção da varíola abrindo caminho para o desenvolvimento de vacinas. Apesar de serem consideradas pela Organização Mundial da Saúde (OMS) o maior avanço em saúde pública depois da água potável, ainda há, em todo o mundo, quem acredite que as vacinas não sejam necessárias, e até mesmo que elas podem estar associadas ao surgimento de problemas como o autismo, por exemplo. A crença equivocada resulta em centenas de pessoas suscetíveis à ação de vírus e bactérias o que pode colocar em risco conquistas como o controle da circulação do vírus do sarampo no Brasil. Essa questão será discutida por médicos de todo país em Salvador (BA), de 1 a 4 de agosto, durante a 14ª Jornada Nacional de Imunizações da SBIm (Sociedade Brasileira de Imunizações) que tem como tema central “Indivíduo imunizado, coletividade protegida”.
“Vacinas salvam vidas. Seus possíveis efeitos adversos são conhecidos e previstos: elas podem provocar dor no local da aplicação, pequeno mal-estar ou febre passageira. Sabemos também que, em mais de 90% dos casos, a vacina é totalmente eficaz”, afirma Renato Kfouri, presidente da SBIm Nacional. O médico lembra a importância das altas coberturas vacinais (número de pessoas vacinadas), não apenas para prevenir surtos e epidemias, mas também para garantir a proteção daqueles que, por questões de saúde e/ou idade, não estejam imunizados. São exemplos as pessoas com o sistema imunológico comprometido ou com o esquema vacinal incompleto, como os recém-nascidos.
O sarampo ilustra a situação. Em 2011, foram registrados 26 casos da doença no Estado de São Paulo – cerca de 60% entre crianças não vacinadas por opção dos pais, segundo a Secretaria Estadual de Saúde. O caso ganhou projeção quando seis bebês menores de 1 ano, de um berçário no bairro Butantã, transmitiram a doença para quatro crianças com idades entre cinco e dez anos que não estavam imunizadas. “Essas ocorrências preocupam não apenas pelas vidas que correm risco desnecessário, mas porque grande parte das famílias que decide não imunizar seus filhos é de classe alta, com fácil acesso à informação”, analisa Isabella Ballalai, diretora da SBIm Rio de Janeiro e membro da comissão científica da Jornada.
Outro exemplo é a coqueluche. No passado, ela acometia mais crianças pequenas, foco de campanhas de vacinação. Mas, como a imunidade contra a doença não dura mais que dez anos, é grande o número de jovens e adultos vulneráveis. Estes, muitas vezes de forma assintomática, são os principais transmissores da bactéria Bordetella pertussis para bebês ainda não imunizados, segundo Ballalai. “O bebê só completa seu ciclo de vacinação contra coqueluche após o sexto mês de vida, por isso o adulto que convive com ele deve estar vacinado”, acrescenta. No exterior, a doença tem sido tema de campanhas que, nos Estados Unidos, ganhou adesão da atriz Jennifer Lopez em vídeo divulgado em todo o mundo.
Informação falsa; risco real
Os motivos que levam pais a não vacinar seus filhos variam, mas envolvem, principalmente, doutrinas médicas e o uso de medicamentos alopáticos só em casos de emergências. Muitas vezes, essas opiniões estão baseadas em supostos estudos científicos ou “denúncias” de manipulações por parte da indústria farmacêutica, como os boatos de que “o excesso de vacinas pode provocar doenças como câncer e o autismo”. Se não há certeza quanto à intenção por trás dos boatos, não há duvida dos efeitos danosos. “É muito confortável não vacinar o seu filho quando todas as outras crianças ao redor estão imunizadas. Imagine só se todas as famílias tomassem essa decisão. Eu pergunto a esses pais se seria interessante, então, a gente voltar a ter varíola, sarampo, pólio?”, questiona Ballalai.
As imunizações evitam mais de 3 milhões de mortes no mundo a cada ano, entre todos os grupos etários, por isso é considerada uma das intervenções mais bem-sucedidas e de melhor custo-efetividade em saúde. A avaliação é da OMS que comemora a conquista e lança um alerta: “Devido às lacunas na cobertura vacinal, doenças como a difteria, o sarampo e a poliomielite estão retornando”, informa o site da entidade que destaca: “Os surtos de doenças afetam a todos”.
Imunização do indivíduo, proteção coletiva
Presidente da Jornada Nacional e representante da SBIm na Bahia, Jacy Andrade observa que a vacinação não protege apenas quem está sendo vacinado, mas também as pessoas que estão à sua volta. “No caso da vacina do sarampo, a eficácia é de 95%. Isso quer dizer que de 100 crianças vacinadas, 95 ficam protegidas. Esses 5% vão se acumulando, contudo, se a cobertura vacinal for alta, terão baixíssimo risco de contrair a doença. Mas, se 5% da população não se vacina e 5% da população vacinada não fica protegida, sobe para 10% o percentual de suscetíveis, proporção que tende a aumentar ao longo do tempo”, explica a médica que é professora do departamento de infectologia da Universidade Federal da Bahia (UFBA). Segundo ela, o sucesso da vacinação depende da cobertura vacinal, daquilo que é chamado proteção de rebanho. “Para eliminar uma doença ou tê-la sob controle, é necessária tal cobertura”, informa.
Para Renato Kfouri, presidente da SBIm Nacional, “o Brasil possui um dos melhores programas de imunização no mundo, o que possibilitou a erradicação da poliomielite e o controle do sarampo. Contudo, a adesão da população às campanhas não pode diminuir”, destaca. “A maior parte dos jovens com menos de 30 anos nunca viu uma pessoa com sequela de paralisia causada por pólio e sequer conhece alguém que tenha tido sarampo, mas isso não significa que possamos negligenciar a vacinação, sob pena da reintrodução desses vírus entre nós”, analisa Kfouri.
É preciso garantir às crianças uma chance de crescer saudáveis, ir à escola e melhorar as suas perspectivas de vida. “As vacinas têm o poder não só para salvar, mas também para transformar vidas”, defende o médico. A OMS destaca que, da criança até o idoso, a imunização previne doenças debilitantes, que podem incapacitar ou levar à morte por causas como difteria, hepatite A e B, sarampo, caxumba, doença pneumocócica, poliomielite, diarreia por rotavírus, tétano e febre amarela. “Os benefícios da imunização são cada vez mais estendidos a adolescentes e adultos, fornecendo proteção também contra doenças potencialmente fatais, como a gripe, meningite e câncer”, informa o médico.
A 14ª Jornada Nacional de Imunizações vai reunir especialistas de diversas formações e de todo o país. A escolha da Bahia para sediar o evento teve como objetivo deslocar o fórum de discussão do eixo Rio-São Paulo, facilitando o acesso de profissionais do Norte e Nordeste à produção de conhecimento e de estratégias de prevenção. O evento tem o apoio da Sociedade Baiana de Pediatria e da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo). A programação completa e informações sobre inscrição estão disponíveis em www.jornadasbimba.com.br.
Outras informações:
No site da Sociedade Brasileira de Imunizações é possível acessar os calendários do Prematuro, da Criança, do Adolescente, do Adulto, do Idoso e também o calendário de vacinação Ocupacional. http://www.sbim.org.br/calendarios.htm.
SERVIÇO:
14ª Jornada Nacional de Imunizações
Local: Hotel Pestana
Rua Fonte do Boi, n. 216 – Rio Vermelho
Salvador – Bahia
Logística local: (71) 2102-6600