Por Elton Alisson Agência FAPESP – A médica e cientista chinesa naturalizada norte-americana Rui-Ping Xiao permaneceu mais de 20 anos nos Estados Unidos, onde fez doutorado e pós-doutorado e tornou-se pesquisadora sênior dos Institutos Nacionais de Saúde (NIH, na sigla em inglês) em Baltimore. Em 2005, ela foi convidada a retornar à China para fundar o Instituto de Medicina Molecular da Peking University – o primeiro instituto de pesquisa autônomo da instituição, ranqueada como a melhor universidade da China, de acordo com o Times Higher Education (THE). Com financiamento inicial de 80 milhões de yuans (aproximadamente US$ 13 milhões) e o apoio de 985 programas de pesquisa chineses, o objetivo do centro de pesquisa interdisciplinar é promover no país a medicina translacional, aquela que vai da geração de conhecimento nas bancadas de laboratório até a sua transferência para a prática médica.
Dirigido por Xiao, o instituto de pesquisa básica e translacional é focado em doenças cardiovasculares e metabólicas e reúne hoje mais de 200 pessoas, entre pesquisadores e estudantes de pós-graduação de diferentes nacionalidades, distribuídos em 12 laboratórios, 7 unidades de apoio tecnológico e um centro de pesquisa com primatas.
A ambição, segundo a pesquisadora chinesa, é que o instituto contribua para formar a próxima geração de pesquisadores líderes no país em medicina translacional e que seja um centro de pesquisa molecular de classe mundial, a exemplo dos existentes nos Estados Unidos e Europa.
“A China avançou muito em ciência e tecnologia e o investimento em pesquisa em diversas áreas aumentou rapidamente no país nos últimos dez anos”, afirmou Xiao. “Mas ainda estamos só começando a nos desenvolver no campo das pesquisas clínicas aplicadas à saúde”, disse a pesquisadora a um grupo de jornalistas brasileiros após sua palestra no Simpósio Brasil-China para Colaboração Científica –FAPESP Week Beijing, na China.
Promovido pela FAPESP e pela Peking University, o evento reuniu, entre 16 e 18 de abril, pesquisadores dos dois países para discutir estudos nas áreas de Ciência dos Materiais, Meio Ambiente, Energias Renováveis, Agricultura, Ciências da Vida, Medicina e Saúde, com o intuito de fomentar a colaboração científica.
“Ao longo da última década, pude testemunhar o rápido avanço da ciência e tecnologia na China, em geral, e na pesquisa biomédica, em particular”, afirmou Xiao.
“Retornei à China porque é o meu país e sinto que tenho a obrigação e a responsabilidade de contribuir para o desenvolvimento da pesquisa clínica aqui e para a formação de uma geração de jovens pesquisadores”, avaliou.
De acordo com a pesquisadora, o instituto que dirige contribuiu para o surgimento de diversas outras instituições de pesquisa similares na China nos últimos anos.
Uma das razões de ter aceitado o convite de dirigir o Instituto de Medicina Molecular da Peking University, segundo ela, foi o fato de a instituição ser a melhor universidade do país e possuir uma infraestrutura que possibilita o desenvolvimento de pesquisas clínicas de ponta.
A universidade chinesa possui, por exemplo, nove hospitais afiliados e 12 hospitais técnicos e de ensino.
“Temos ótimas instalações, parcerias com indústrias farmacêuticas e um padrão internacional de pesquisa clínica e translacional”, afirmou Xiao. “Isso me dá a confiança de que podemos fazer algo único em termos de pesquisas clínicas e translacionais”, avaliou.
Síndrome metabólica
As pesquisas de Xiao no Instituto de Medicina Molecular da Peking University estão voltadas ao estudo e ao desenvolvimento de novas abordagens para o tratamento da síndrome metabólica – grupo de desordens metabólicas que inclui obesidade central (localizada acima da cintura), dislipidemia, hiperglicemia e hipertensão.
Considerada uma das mais graves ameaças à saúde humana na atualidade, a síndrome metabólica aumenta duas vezes o risco de desenvolvimento de doenças cardiovasculares e cinco vezes o risco de diabetes tipo 2, destacou Xiao.
“A resistência à insulina é um fator patogênico fundamental partilhado por várias dessas desordens metabólicas, incluindo a obesidade e o diabetes tipo 2”, disse a pesquisadora.
Recentemente, o grupo de Xiao descobriu que a MG53 – uma proteína expressa especificamente em músculos cardíacos e esqueléticos – medeia a degradação do receptor da insulina e do substrato do receptor da insulina em camundongos. E que, quando expressa em níveis elevados, a proteína provoca a síndrome metabólica, dando origem à resistência à insulina, obesidade, hipertensão e dislipidemia.
Ao aumentar a expressão de MG53 transgênicos em camundongos, os pesquisadores constataram que isso induziu a obesidade, desencadeou a resistência à insulina, causou hipertensão e hipertrofia cardíaca e dilatação ventricular do coração dos animais.
“Os resultados que obtivemos permitem definir a MG53 como alvo terapêutico promissor para o tratamento de desordens metabólicas e complicações cardiovasculares associadas a elas”, afirmou Xiao.
O artigo Central role of E3 ubiquitin ligase MG53 in insulin resistance and metabolic disorders (doi: 10.1038/nature11834), de Xiao e outros, publicado na revista Nature, pode ser lido emwww.nature.com/nature/journal/v494/n7437/full/nature11834.html.