Uma das medidas anunciadas pelo governo para reduzir os gastos públicos em 2016 é a suspensão de concursos públicos. Pelos cálculos da equipe econômica, a medida vai resultar em economia de R$ 1,5 bilhão para os cofres federais. O governo ainda não detalhou a quantidade e quais concursos serão suspensos.
O diretor e fundador do Grancursos Online, curso preparatório para concurso público, Gabriel Granjeiro, lembra que não é a primeira vez que o Executivo adota esse tipo de medida para cortar gastos e a tendência é que os concursos continuem ou apenas sejam adiados.
“A intenção do governo é mostrar austeridade para o mercado. Certamente esse corte não será tão profundo como foi anunciado, porque é impossível não fazer novos concursos. Até porque para superar a situação em que se encontra o Brasil precisará de servidores”, disse Granjeiro. “Por exemplo: como o governo, sem pessoal nem recursos para fiscalizar empresas, vai fazer caixa abrindo mão de contratar mais auditores fiscais do trabalho? Economizar dessa forma diminui também a capacidade de obtenção de recursos públicos”, acrescentou.
Segundo o diretor, sempre que o governo passa por um momento econômico difícil ou de transição anuncia cortes desse tipo. “Em 2011, houve anúncio similar…. O que vimos é que esses cortes nunca são absolutos porque aparecerão urgências que obrigarão o governo a abrir exceções. É o caso do INSS [instituto Nacional do Seguro Social]. Sem novos funcionários ele entrará em colapso. Recentemente o IBGE [Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística] cancelou uma pesquisa por falta de servidores. Além disso, há 2 mil estagiários trabalhando em defensorias públicas, na tentativa de dar conta da demanda. Há muitos exemplos”, disse.
“Nossa expectativa é de que, a exemplo de 2011, os concursos sejam retomados meses depois do anúncio da suspensão. Naquele ano, 24 mil vagas foram preenchidas por concursos nos Três Poderes. E, em 2012, houve um grande boom de concursos. O mesmo ocorreu em anos anteriores, durante outros episódios de crise como as do governo Fernando Henrique Cardoso. Vimos o mesmo tipo de atitude: o governo segurou por um tempo [os concursos] e depois foi liberando aos poucos, com cautela, na medida em que as questões urgentes foram aparecendo”, lembrou o diretor.
Mudanças
Para suspender os concursos, o governo terá de encaminhar ao Congresso mudanças nos projetos de Lei de Diretrizes Orçamentárias e de Lei Orçamentária Anual, que estão em tramitação no Congresso. A diretora executiva da Associação Nacional de Proteção e Apoio aos Concursos (Anpac), advogada Maria Thereza Sombra, disse que a medida deve enfrentar resistência dos parlamentares. “Primeiro, vai ter que enviar para a Câmara, que vai mudar a proposta orçamentária que tinha sido aprovada para este ano”, destacou. Segundo a diretora executiva da Anpac, o projeto atual prevê um número de vagas para concurso público e, com isso, o tema terá de ser rediscutido no Legislativo.
De acordo com a diretora, o governo deveria cortar pela metade o número de cargos de confiança na administração pública e extinguir os terceirizados, em vez de suspender os concursos. Maria Thereza Sombra lembra que alguns órgãos do governo federal, como Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal e Receita Federal, necessitam de novos servidores em seus quadros para não entrar em colapso e vão precisar fazer concursos.
Com o aumento do desemprego e a dificuldade em conquistar uma vaga na iniciativa privada, a busca pela estabilidade do serviço público cresceu, conforme a diretora, e não é o momento ideal para suspender os concursos. “Cresceu demais a procura por concurso público. É outro viés político”.
Números da Anpac mostram que as inscrições para concursos públicos nas três esferas de governo (federal, estadual e municipal) chegam de 10 a 12 milhões por ano. Só na área federal, que tem salários mais altos, as inscrições chegam a 6 milhões anualmente, informou Maria Thereza Sombra.
Legislativo e Judiciário
Segundo Gabriel Granjeiro, a medida do governo federal não deve afetar os concursos dos poderes Judiciário e Legislativo e ministérios públicos, que têm orçamento próprio e podem fazer suas seleções. “Eles até podem aderir ao que foi proposto pelo governo federal, se for o caso. No entanto, eles têm autonomia para decidir o que fazer. O Judiciário é o que oferece as carreiras mais atrativas em função das remunerações, e o Executivo é o que oferece vagas em maior quantidade. Mas o Judiciário até chega perto do Executivo [no que se refere a número de vagas], em função da alta rotatividade e das aposentadorias”.
Ele diz que o setor de concursos não tem sentido tanto os efeitos da crise. “Muito pelo contrário. Desde o início do ano identificamos aumento do interesse em nossos cursos. Em geral, a crise acaba beneficiando nosso setor, pela dificuldade das pessoas em entrar no setor privado, e por a progressão, dentro de uma empresa privada, demorar muito mais do que o tempo que se leva para se preparar e passar em um concurso”. A preparação para concursos é, segundo ele, de médio e longo prazo. “Mesmo que haja cortes em um primeiro momento, depois a tendência é que seja recuperado. Quem se mantiver estudando terá melhores condições de estar preparado”.
Trabalhando há 9 anos com concursos, a gerente administrativa, Islaine Souza Oliveira, do LFG concursos, não é tão otimista. “Nos corredores daqui, as grandes preocupações estão relacionadas ao risco de privatizações e de se por fim nos concursos”, disse ao avaliar a medida do governo cortar concursos. “Esse corte não é positivo porque a gente vive de concursos. A partir do momento que não tem concurso, e o aluno não vê uma oportunidade de estudar a longo prazo, ele deixa a sala de aula de lado”, disse.
De acordo come ela, o setor tem sentido os efeitos da atual situação econômica. Islaine Oliveira informou que as inscrições nos cursos caíram 40% desde julho. “Com esses cortes e, em especial, com o anúncio de não aumento dos salários de servidores a tendência é de um cenário ainda pior”, disse. A gerente espera retomada do negócio no início do próximo ano.
Alana Gandra e Pedro Peduzzi – Repórteres da Agência Brasil
Edição: Carolina Pimentel