Agência FAPESP | Elton Alisson, de Montevidéu – Pesquisadores do Instituto de Química da Universidade Estadual Paulista (Unesp), campus de Araraquara, desenvolveram em parceria com colegas da University of Oxford, da Inglaterra, uma plataforma tecnológica que pode resultar na criação de biossensores ultrassensíveis para o diagnóstico rápido e precoce de uma série de doenças, como câncer de mama e de próstata, mal de Parkinson e Alzheimer, entre outras.
Resultado de um , apoiado pela FAPESP, a tecnologia foi apresentada durante a .
Organizado pela Asociación de Universidades Grupo Montevideo (AUGM), a Universidad de la República (UdelaR) e a FAPESP, o simpósio, que ocorre até sexta-feira (18/11) no campus da UdelaR, em Montevidéu, tem como objetivo fortalecer as colaborações atuais e estabelecer novas parcerias entre pesquisadores da América do Sul nas diversas áreas do conhecimento. Participam do encontro pesquisadores e dirigentes de instituições do Uruguai, Brasil, Argentina, Chile e Paraguai.
“A plataforma tecnológica que temos desenvolvido é tão sensível que permitiria detectar câncer de próstata, por exemplo, em um estágio muito inicial, quando ainda há poucas células cancerígenas em circulação e que seriam impossíveis de serem diagnosticadas por meio de uma biópsia, por exemplo”, disse Paulo Roberto Bueno, professor da Unesp de Araraquara e coordenador do projeto, à Agência FAPESP.
O método consiste na medição da presença de anticorpos específicos, proteínas ou outros biomarcadores (parâmetros biológicos mensuráveis que permitem conhecer o estado de uma doença ou a resposta a um fármaco) numa amostra de sangue ou outros tipos de amostras biológicas por meio de eletrodos em escala microscópica.
Ao imobilizar uma molécula biológica, como um anticorpo marcador de uma determinada doença, na superfície dos microeletrodos projetados em nível molecular, é possível detectar, por exemplo, a presença de seu antígeno em uma amostra de sangue, por meio de métodos capacitivos quânticos (sinais quânticos moleculares).
Isso porque, ao entrar em contato com o anticorpo imobilizado sobre o microeletrodo, o antígeno presente na amostra de sangue de um paciente altera o sinal elétrico capacitivo (a carga elétrica) da superfície do material de forma bastante sensível.
Com base na medição da mudança do sinal elétrico da superfície dos microeletrodos é possível determinar em minutos a presença do antígeno na solução e quantificá-la de forma específica e livre de efeitos interferentes de outras proteínas existentes na matriz sanguínea.
“Esse processo nos permite criar um sistema ultrassensível e altamente seletivo para determinar a presença de moléculas biológicas de interesse clínico em uma amostra de sangue, por exemplo”, afirmou Bueno.
A fim de identificar apenas um tipo de molécula de interesse dentre milhares de outras presentes na amostra de sangue de um paciente – e que também podem afetar o sinal elétrico –, o sistema faz uma análise espectroscópica de substâncias baseada na produção e interpretação de seus espectros de capacitância (grandeza elétrica).
Para isso, o método proposto por um grupo de pesquisadores liderado por Bueno compara, por exemplo, uma amostra de sangue padrão sem a presença de um determinado anticorpo – utilizado como sinal elétrico de referência – com a amostra que se pretende analisar.
Qualquer sinal elétrico diferente do sinal de referência pode ser identificado e quantificado pelo método, explicou Bueno.
“Essa tecnologia também permite a combinação de vários eletrodos para detectar a presença e quantificar diversos biomarcadores simultaneamente, como os associados ao câncer de próstata”, exemplificou o pesquisador.
O principal biomarcador da doença é o Antígeno Prostático Específico (PSA) que, em níveis elevados, indica o desenvolvimento desse que é o segundo tipo de câncer que mais causa mortes de homens no Brasil – atrás apenas do câncer de pulmão. Os níveis de PSA, contudo, podem variar naturalmente.
A fim de determinar o risco de um paciente desenvolver câncer de próstata, o método pode rastrear ao mesmo tempo o PSA e outros biomarcadores, como o PSA total e uma proteína chamada PAP, também relacionada à doença.
“Se o sistema detectar que todas essas três proteínas estão variando de forma constante e concomitante em um determinado paciente, o médico pode identificar o risco de desenvolvimento da doença e encaminhá-lo para um tratamento preventivo, por exemplo”, disse Bueno.
“O mesmo conceito é válido para outras doenças degenerativas, como o mal de Parkinson e Alzheimer, que necessitam de diagnóstico precoce”, avaliou.
Os pesquisadores vislumbram a possibilidade de utilizar a tecnologia para fazer diagnóstico emergencial de outras doenças, como a dengue e as causadas pelo Zika vírus, no local de ocorrência.
Em vez de coletar a amostra de sangue de um paciente com suspeita de infecção pela dengue ou Zika vírus e enviá-la a um laboratório para análise – o que pode demorar semanas –, o método poderia ser usado para analisar a amostra na própria residência por agentes de saúde. Os resultados dos exames poderiam ser encaminhados via internet para um hospital da região onde o paciente seria encaminhado para tratamento.
“Além de agilizar o diagnóstico, o método pode ser útil para mapear focos dessas doenças e alertar o sistema de saúde, por meio da criação de um banco de dados inteligente, que poderia resultar no desenvolvimento de um método de vigilância on-line para todo o país, possível de ser atualizado diariamente”, avaliou Bueno.
Potencial de mercado
A tecnologia resultou em cinco patentes, depositadas pela University of Oxford em cotitularidade com a Unesp e divididas entre pesquisadores das duas instituições.
De olho no potencial de mercado do sistema, a universidade britânica fundou uma spin-off – empresa nascente de base tecnológica derivada de uma instituição de pesquisa –, chamada Oxford Impedance Diagnostics, que licenciou três das cinco patentes e pretende ampliar o desenvolvimento da plataforma tecnológica.
A startup obteve um financiamento “semente” (seed money) de 2 milhões de libras esterlinas – equivalente a quase R$ 7 milhões – de investidores, incluindo fundos de investimento da própria University of Oxford, e investidores “anjos”.
“O modelo de negócios da empresa indica que em até oito anos devem ser criados alguns testes rápidos que serão comercializados internacionalmente para detecção de uma série de doenças com base na plataforma tecnológica que estamos desenvolvendo”, afirmou Bueno.