Maria Fernanda Ziegler, de Nova York | Agência FAPESP – As águas do canal Gowanus, na região do Brooklin, em Nova York, continuam não cheirando bem, embora o problema tenha sido muito pior. São resquícios de anos de poluição industrial e de esgoto não tratado. O local, que nos séculos 19 e 20 era formado basicamente por fábricas, passou por uma revitalização nos últimos anos com investimento federal. Novas áreas verdes foram instaladas e comércios exclusivamente de serviços chegaram ao bairro. O preço dos imóveis residenciais também foi elevado, o que acabou por expulsar antigos moradores.
A história recente do canal Gowanus tem sido repetida em outras áreas vizinhas em Nova York, assim como em outras cidades do mundo. De acordo com Tammy Lewis, professora de Sociologia e Ciências Ambientais e da Terra na City University of New York (CUNY), iniciativas como essas, embora positivas para o meio ambiente, tendem a aumentar a desigualdade e, assim, minar o pilar social do desenvolvimento sustentável – composto por ambiental, econômico e social.
“A ideia consiste em apropriar-se de recursos ambientais danificados, restaurar, desenvolvê-los e vendê-los ao que chamamos de a classe sustentável. O que vemos é que esse fenômeno está acontecendo em todo o mundo”, disse Lewis em palestra na , realizada de 26 a 28 de novembro de 2018.
Lewis é uma das autoras do recém-lançado Green Gentrification: Urban sustainability and the struggle for environmental justice, livro em que analisou cinco áreas que passaram por gentrificação verde.
“Iniciativas de recuperação ambiental são sempre positivas, mas precisam ser analisadas de uma forma mais ampla. Elas melhoram as condições ambientais do bairro, mas geram a gentrificação verde, o que é extremamente negativo”, disse.
Lewis ressalta que o maior problema está na troca de moradores. “O local passa a atrair migrantes brancos e ricos e a classe trabalhadora e os mais pobres são empurrados para fora, por causa da elevação dos preços dos imóveis. Sem intervenção de políticas públicas orientadas para a equidade, ações de urbanismo verde e negativamente redistributivas são ruins para as principais cidades globais”, disse.
A pesquisadora afirma que, ao contrário do que se divulga, os resultados de injustiça ambiental podem ser evitados. “As iniciativas de políticas verdes precisam ser acopladas a iniciativas de políticas de habitação justas”, disse.
Cidades como parte da questão climática
Em 2012, antes de ser iniciado o processo de gentrificação verde no canal Gowanus, o furacão Sandy devastou a região. O nível do canal subiu por causa das fortes chuvas do Sandy e a água poluída se misturou ao esgoto não tratado.
No entanto, até agora não foi instalada estrutura suficiente de mitigação para o problema. “A infeliz ironia é que, quando o canal inundou, foram atingidos os negros. Agora, quando outro fenômeno extremo como o Sandy ocorrer, será a classe sustentável a ser atingida”, disse Lewis.
William Solecki, diretor fundador do Institute for Sustainable Cities da CUNY, afirma que as cidades, pela primeira vez, estão se tornando participantes na resposta global às mudanças climáticas. “ Reconhecemos que estamos num mundo urbanizado e as ações têm que partir das cidades”, disse Solecki também em palestra na FAPESP Week.
“Mas o que ocorre quando chegamos ao limite da resiliência? Construir prédios cada vez mais fortes? Há um limite. As cidades, portanto, não vão ter só que se adaptar, mas também mitigar”, disse.
Solecki afirmou que as consequências do furacão Sandy são sentidas até hoje na cidade de Nova York e que o evento extremo serviu como um ponto de inflexão, que levou as pessoas a notarem a necessidade de planos de adaptação. “Precisamos pensar no que as cidades podem fazer para criar ações transformadoras”, disse.
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