Carlos Fioravanti | Revista Pesquisa FAPESP – Em Bela Cruz, Trairi, Fortaleza, Mulungu e outras 10 cidades cearenses, pesquisadores de São Paulo e do Ceará identificaram 27 pessoas de 22 famílias com uma doença genética rara chamada picnodisostose.
Causada por mutações que favorecem o acúmulo de cálcio nos ossos, essa enfermidade caracteriza-se pela baixa estatura, imperfeições na estrutura da cabeça e da face, dedos curtos e ossos frágeis. Ampliando o estudo, os especialistas encontraram 15 pessoas com a mesma doença em nove cidades da Paraíba, Goiás, São Paulo, Maranhão e Rio Grande do Sul.
“As famílias com picnodisostose de fora do Nordeste não se conheciam, mas tinham um ancestral comum no Ceará”, explica a médica geneticista Denise Cavalcanti, professora da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (FCM-Unicamp) e coordenadora do estudo. Em novembro, sua equipe trabalhava nos exames de seis moradores de duas famílias de Salvador, na Bahia, com essa doença, a mesma do pintor francês Henri de Toulouse-Lautrec (1864-1901). “À medida que procuramos”, diz ela, “as doenças raras se mostram não tão raras assim”.
A picnodisostose é uma das patologias que constam de um novo censo nacional sobre a ocorrência de doenças raras, de origem genética, ambiental ou congênita, feito por pesquisadores da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e do Instituto Nacional de Genética Médica e Populacional (Inagemp).
Em relação ao mapeamento anterior, realizado em 2014, o trabalho atual ampliou de 88 para 144 o total de municípios com alta prevalência (proporção de casos na população) de pessoas com doenças raras. O estudo, publicado em junho de 2018 na Journal of Community Genetics, mostrou que a quantidade de pessoas identificadas com esse tipo de enfermidade subiu de 4.100 para cerca de 10 mil no país.
“Conseguimos agora ter uma ideia melhor das mutações e dos erros de metabolismo que causam as doenças genéticas raras e da quantidade de pessoas que estão ou não sendo tratadas”, explica a médica geneticista Lavínia Schuler-Faccini, professora da UFRGS e coordenadora do levantamento atual e do anterior.
Maioria no Nordeste
A amostragem ainda é limitada. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), o Brasil abrigaria cerca de 13 milhões de pessoas com alguma enfermidade dessa categoria, ou seja, um a cada 16 indivíduos. “Cada doença pode atingir um número reduzido de pessoas, mas a soma de todas elas afeta uma parcela expressiva da população”, comenta Lavínia.
Existem de 5 mil a 8 mil doenças raras conhecidas, em geral crônicas e progressivas. A maioria (80%) é causada por mutações genéticas, incluindo formas de câncer hereditário. Outras são causadas por fatores ambientais, como as malformações decorrentes da infecção pelo vírus zika. Para a maioria dessas doenças, não há medicamentos específicos, apenas tratamento de apoio, como fisioterapia e fonoaudiologia. Quando existe medicação, é geralmente importada e obtida por meio de decisões judiciais.
De acordo com os levantamentos do Inagemp, a maioria das pessoas afetadas vive no Nordeste, onde o casamento entre parentes, uma prática que favorece a propagação de mutações patogênicas, é mais comum que em outras regiões. A cidade de Monte Santo, na Bahia, apresenta casos de mucopolissacaridose, fenilcetonúria e surdez congênita.
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